sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Tirar o pó da história das lutadoras!

Por Diana Assunção*

Neste 8 de março as Edições ISKRA apresentarão seu próximo título que compõe a Coleção Mulher: A edição brasileira do livro Lutadoras - Histórias de mulheres que fizeram história, originalmente publicado em Buenos Aires, Argentina, no ano de 2006 com organização de Andrea D´Atri. A nova edição contará com os artigos originais, que trazem a história de mulheres como Flora Tristán, Louise Michel, Rosa Luxemburgo, entre outras, mas também com a incorporação de mulheres brasileiras como Patrícia Galvão, e uma primeira reflexão sobre o papel das mulheres na reorganização operária da década de 1970.

Essa pesquisa não foi tarefa simples. Afinal, o papel das mulheres na história tem sido silenciado durante séculos. Quando apareciam, era em “casos excepcionais” onde as mulheres adquiriam importância por “estranhas” aptidões para a ciência ou para a arte, ou ainda porque “obscuros desígnios divinos” buscaram erguê-las como “rainhas” ou “santas”. Isto se modificou drasticamente com a segunda onda feminista na década de 1970, quando ativistas e acadêmicas começaram a questionar esta ausência e se propuseram a investigar as mulheres na história. Mas se a opressão social das mulheres está na base desta eliminação da participação de metade da humanidade nos processos históricos, isso se deu de forma mais aguda quando se tratou das mulheres lutadoras, rebeldes e revolucionárias.

Em Pão e Rosas: Identidade de gênero e antagonismo de classe no capitalismo, primeira publicação da Coleção Mulher, buscamos entrelaçar as questões relativas à opressão e à exploração ao longo da história da luta de classes que se abre com a Revolução Francesa e a Revolução Industrial. Agora, com a publicação de Lutadoras..., nos propusemos a resgatar, com nomes e sobrenomes, algumas das protagonistas deste período, que não foi isento de combates heróicos da classe trabalhadora e dos setores populares na luta por sua emancipação. Estas biografias foram reelaboradas em função dos próprios processos dos quais estas mulheres participaram, destacando este aspecto acima de outros relativos às suas vidas privadas. Não foi uma decisão ingênua: nas biografias masculinas, é pouca a atenção dada às vidas conjugais dos homens referenciados, suas paternidades e outros detalhes de seu cotidiano; no entanto, é habitual que as biografias femininas destaquem estes aspectos acima de outros. Ao contrário, neste trabalho, queremos mostrar a vida destas mulheres a partir do lugar que elas mesmas decidiram ter na história, como protagonistas de seu tempo.

Estas mulheres as quais retrata Lutadoras..., viveram sob o domínio do sistema capitalista. Desde seus primórdios, revolucionando a sociedade e as relações pessoais, o capitalismo arrancou a mulher do âmbito privado, acabando com as aspirações obscurantistas da Igreja, que naturalizava a clausura da mulher dentro de sua casa, no âmbito doméstico. Em plena Revolução Industrial, com o desenvolvimento da técnica e da maquinaria, o capitalismo tornou possível a desmistificação da suposição de tarefas, trabalhos ou profissões masculinas ou femininas, baseados nas diferenças anatômicas. Mais tarde, o desenvolvimento da medicina e da ciência permitiu que, pela primeira vez na história, pudesse se separar a reprodução do prazer, questionando, desta forma, a concepção de que a maternidade é o único projeto de vida para a realização das mulheres. E também, tornou em uma possibilidade ao alcance das mãos a socialização e industrialização das tarefas domésticas. Porém, sua enérgica revolução nas relações sociais de produção, que poderia arrastar velhos preconceitos e construir novas relações pessoais, só foram tendências que não puderam desenvolver-se integralmente sob a sobrevivência da propriedade privada dos meios de produção. Não à toa as mulheres permaneceram com a responsabilidade pelo trabalho doméstico, assim como milhares seguem morrendo todos os anos pela impossibilidade de interromper a gravidez de forma segura.

Na história da luta de classes sob o domínio do capital, deparamo-nos com batalhas nas quais as mulheres desprenderam toda sua energia e criatividade, acaudilhando as massas oprimidas, levantando-se com elas e erguendo-se como valorosas combatentes contra a exploração e a opressão capitalista. Queremos homenageá-las através deste trabalho de pesquisa que em breve apresentaremos. Mas também queremos aprender com suas vidas e que estas sirvam de inspiração para as jovens gerações de operárias e da juventude que aspiram ser sujeitos conscientes de sua própria emancipação. A história continuou. A década de 1970, que assistiu ao surgimento do feminismo da segunda onda, foi também um período no qual as massas desprenderam sua energia combativa e radicalizada contra os pilares da ordem mundial. As mulheres voltaram a ser protagonistas de gestos heróicos na Primavera de Praga, nas greves da Polônia, Maio Francês, no Cordobazo, nos cordões industriais chilenos, em Tlatelolco no México...

Diante de um momento histórico onde o capitalismo volta a ser questionado em sua essência de exploração de uma classe sobre outra, conhecer e aprender como bravas mulheres foram capazes de subverter a ordem é, no mínimo, inspirador. Queremos, dessa forma, nos preparar para as próximas batalhas, onde certamente novas lutadoras surgirão. Convidamos as (os) estudantes que contestam a “história oficial” dentro das salas de aula impregnadas da ideologia patriarcal, para que continuemos tirando o pó dessas histórias, das quais as mulheres têm sido protagonistas com sua criatividade e sua fortaleza, no caminho da luta da humanidade pela sua libertação definitiva.


*Diana Assunção é organizadora da edição brasileira de Lutadoras – Histórias de mulheres que fizeram história e estudante de História da PUC-SP. Militante da Liga Estratégia Revolucionária, é também uma das fundadoras do grupo de mulheres Pão e Rosas.

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