sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

“O Brandão é meu amigo, mexeu com ele, mexeu comigo!”

Entrevista com Brandão, dirigente do Sintusp, demitido no final do ano

Desatai o Futuro: Você foi demitido. Qual o interesse da reitoria ao fazer isso?

B: A demissão é parte de uma tentativa da Reitoria de destruir a organização dos funcionários da USP com o intuito de dificultar que os trabalhadores continuem se organizando de forma combativa, como vem acontecendo nos últimos anos. Quando o sindicato consegue se ligar com o movimento estudantil, protagonizamos lutas importantes, como foi a greve de 2000; a luta contra a regulamentação das fundações; a greve em 2004 que de uma luta salarial os trabalhadores começaram a questionar profundamente o regime universitário da USP; a luta contra o veto do governo Alckmin ao aumento de verbas para as universidades estaduais, em 2005; e como ficou mais nítido do que nunca na greve e na ocupação da reitoria da USP contra os decretos do governo Serra no ano de 2007.

DF:: Há outros processos acontecendo, não?

B: Há um ataque forte sobre o sindicato e sobre nossos ativistas. Minha demissão coloca a possibilidade imediata de demissão de mais dois diretores do Sintusp, o Zelito e o Aníbal, que estão respondendo nesse momento um processo administrativo. Tem o caso do Germano, que é da USP São Carlos, que foi condenado também em outro processo administrativo a uma pena de retenção, e outro companheiro que foi condenado a uma pena de advertência. Todos relacionados a atividades políticas votadas nos fóruns de deliberação de nossa categoria. Tem o Magno e a Neli, que responderam junto comigo também a uma sindicância para apurar responsabilidade por danos na ocupação da reitoria em 2007.

Também tem vários estudantes que estão respondendo processos decorrentes da greve e da ocupação de 2007. E mais três companheiros estão respondendo outro processo também, mais recente, devido a um piquete em frente à Reitoria da USP, votado em assembléia dos estudantes, que também mira dois dirigentes do Sintusp e eu. Isso indica uma ofensiva contra todos os setores combativos da universidade.

DF: E o governo estadual? Pois muitos dos processos, também a estudantes, se deram após um recuo do governo Serra na luta contra os decretos em 2007, a ocupação da Reitoria da USP...

B: Foi uma desmoralização e um recuo político que Serra teve que fazer na greve das estaduais em 2007. Para um cara que pretende ser presidente da República é um pouco difícil de engolir na boa. Agora, Serra busca avançar, por outros meios, na implementação dos ataques que não conseguiu implementar através dos decretos.

Em junho do ano passado, Serra sancionou a Lei Complementar nº 1049, que estabelece diretrizes para a inovação tecnológica em São Paulo, relacionada com as já conhecidas “pesquisas operacionais” que fomos contra em 2007, e que vai muito além das fundações de direito privado, permitindo que a universidade seja colocada muito mais aberta e diretamente a serviços dos interesses capitalistas. Em outubro, o governador assinou o decreto que cria a Univesp (Universidade Virtual do Estado de São Paulo), sistema de ensino superior à distância, que é uma forma do governo “vender” a imagem de “democratização da universidade” através da precarização do ensino.
Minha demissão é um ataque à política do Sintusp de lutar contra as medidas de privatização e precarização que o governo busca aplicar com a colaboração dos seus agentes dentro da USP, que chamamos de burocratas acadêmicos. Por exemplo, esse processo que culminou na minha demissão é um processo que se arrasta desde 2005 em função de um conflito com um diretor da FAU, que militou ativamente contra a organização dos trabalhadores em greve, um cara que declarou no conselho universitário que é contra mais verbas para a universidade. Onde ele está hoje? É secretário de estado do governo Serra, Secretaria do Meio Ambiente. Ele é um dos dedos do braço direito dos tucanos aqui na universidade.
DF: Como está a campanha contra a sua demissão?

B: A campanha tem um forte apoio externo à universidade e também ligado ao mundo acadêmico. São vários intelectuais, mais de uma centena, que assinam o abaixo assinado contra a demissão, exigindo a reintegração e a retirada dos processos contra o pessoal na USP, estudantes e funcionários, que estão sendo processados. Há também o manifesto contra a repressão que o Sintusp lançou no ano passado junto a vários professores.

Tem apoio de parlamentares, Genuíno, Vicentinho, Suplicy, Ivan valente ; são do PT, do PSOL, PCdoB e até do PSB, um vereador que veio aqui no ato, Paulo Vanucci, professores de Direito e juízes do trabalho que também apóiam a campanha. E aí tem as entidades: a Conlutas, a CUT, Movimento Negro Unificado, os partidos de esquerda todos, estão aí apoiando a campanha. Tem milhares de assinaturas de funcionários e estudantes, centros acadêmicos, DCE`s que se colocam contra a demissão pelo que ela representa: uma medida repressiva contra a organização do movimento.

Também existe entre os trabalhadores da USP uma forte disposição de lutar para reverter a demissão. A questão agora consiste em transformar todo esse apoio em luta ativa, ou seja, de construção dos comitês de mobilização por unidades, como votamos em nossa assembléia, a exigência que a Reitoria negocie a reintegração, e, principalmente, a mobilização dos funcionários e estudantes.

Agente também está tentando fazer já uma paralisação. Tem uma proposta indicativa e vamos ver se conseguimos construir para o dia 18. No dia da calourada, que os estudantes vão estar com os ouvidos mais abertos, vamos chamar a atenção pra esse fato, da necessidade de combater a repressão, ver o que a gente consegue fazer juntamente com o DCE e com os centros acadêmicos. A assembléia também aprovou um indicativo de greve para março, contra a demissão, pela reintegração e também para impedir que a Reitora implante uma carreira que vai ser prejudicial pra todo mundo. Aprovou também uma campanha com adesivos, camisetas, faixas, cartazes, etc., com o slogan “o Brandão é meu amigo, mexeu com ele, mexeu comigo”. Agora o desafio é chegar a todas as pessoas que se dispõem a assinar o abaixo-assinado, fazer reuniões nas unidades, incorporar os estudantes na luta contra a repressão, a demissão e o ataque ao Sindicato. Ou seja, tarefa militante de chegar a todas essas pessoas. Em princípio, a campanha está assim.

DF: Qual é, em sua visão, o papel que podem ter os estudantes frente à crise?

B: Eu acho que hoje, com a crise, o que nós estamos vendo no mundo e que começou a impactar, como a mobilização de estudantes na Itália e na Grécia contra as conseqüências da crise, é a certeza de que a tendência vai ser também a de uma ofensiva ideológica repressiva da burguesia contra os trabalhadores, contra o movimento estudantil, contra a juventude. Ou seja, o pior agora não é demissão, desemprego, tirar as condições de vida das pessoas, para a burguesia. O pior seria que as pessoas que estão perdendo o emprego e direitos, aceitem passivamente, sejam massacradas. A aliança operário-estudantil que a gente tem que procurar construir tem que ser no marco do que vimos na Itália e na Grécia, que busque passar à ofensiva, que busque construir uma aliança em mobilização pra fazer com que a burguesia e os patrões paguem a crise, e não os trabalhadores e a juventude, e isso implica em avançar na discussão sobre o programa e sobre que política levar.

Os conflitos na universidade hoje não podem ser mais apenas para defender a universidade. A discussão hoje é outra: que universidade e pra quem? Se continua uma universidade a serviço da burguesia ou vamos lutar por uma universidade a serviço da classe trabalhadora e do povo? Se vamos lutar pelo fim do vestibular, pela estatização das universidades particulares e chegar até os estudantes que pagam, que são em sua maioria filhos de trabalhadores e que não conseguem entrar nas universidades publicas, chegar e estender essa aliança até aí. Vai ter muita gente dizendo que não é hora, como se nós fossemos obrigatoriamente meros objetos da conjuntura e não tivéssemos condição de ser sujeito e influenciar no curso da história. Então é necessário compreender que nós temos condições, meios e obrigação de tentar influenciar o curso da história. Na medida que a história nos coloque a oportunidade de intervir no seu curso, não podemos perder tempo.

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