sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Manifesto frente à crise capitalista e a crise da universidade

Desde setembro de 2008, quando o Lehman Brothers quebrou, já foram mais de 6 trilhões (cerca de 10% do PIB mundial) colocados pelos governos para salvar os capitalistas. Ainda assim, o sistema financeiro global entrou em colapso. A previsão de que 51 milhões percam seus empregos em 2 anos, atingindo 230 milhões de desempregados no mundo “não pretende ser alarmista, mas sim realista”, segundo a Organização Internacional do Trabalho. É o despejo às costas dos trabalhadores dos prejuízos da CRISE.
O pânico do protecionismo se alastra pelo mundo e a tendência cada vez mais forte é de uma Segunda Grande Depressão, uma crise generalizada. Até mesmo para um especulador como George Soros "A magnitude do problema é significativamente maior do que nos anos 30
[1]”. Vejamos um significado pouco discutido dessa comparação: a Grande Depressão deu lugar a enormes convulsões econômicas, sociais e políticas; como expressões mais agudas, houve, pela esquerda, os processos revolucionários na França e Espanha, e pela direita, o nazi-fascismo. Mas tudo isso não foi suficiente para que o imperialismo norte-americano consolidasse sua hegemonia. Para isso, ele foi à maior guerra da história da humanidade que matou mais de 100 milhões e destruiu países inteiros.
Uma nova guerra mundial ainda não aparece no horizonte. Inegável. Mas, seguramente, abriu-se um novo momento de crises na história mundial que, nos seus primeiros meses, já deu lugar a fenômenos como a eleição de Obama. Governo este que, na base de uma grande ilusão de mudança, mostra ser, na realidade, o governo da continuidade, como expressa o envio de 20 mil soldados ao Afeganistão, pela sua equipe recheada de bushistas e que segue defendendo os resgates bilionários aos capitalistas. Também já surgem fenômenos importantes de luta de classes, que vêm se expressando de maneira acelerada. O governo da Islândia foi o 1º a cair devido à crise. Na Grécia, uma revolta social protagonizada pela juventude parou o país, apoiada por uma greve geral. Na França houve uma forte greve geral no dia 29/1 e as mobilizações estão crescendo. Na Itália a juventude saiu massivamente às ruas com a consigna “não pagaremos pela sua crise” e chamou os operários a uma greve geral que a burocracia sindical foi obrigada a convocar no dia 12/12/8. O movimento estudantil espanhol também está numa onda de lutas, com ocupações, atos e ações radicalizadas, como uma paralisação em solidariedade aos palestinos, a mesma demanda de mais de 10 ocupações de universidades na Inglaterra. Houve também revoltas contra a crise na Bulgária e Lituânia. A China é cada vez mais um barril de pólvora, e se estendem as manifestações de operários (que estão tendo que se enfrentar o fechamento de mais de 670 mil fábricas) e camponeses. E no próprio EUA, já teve lugar uma ocupação de fábrica, a Republic Windows and Doors, uma revolta da juventude negra contra a repressão policial em Oakland e uma ocupação de universidade em Nova York.
É por isso que dizemos que nessa crise há um grande perigo, pois, se por um lado, o capitalismo não cai por si só e a burguesia é capaz de arrastar o conjunto da humanidade para uma barbárie ainda maior, por outro, há uma grande oportunidade para aqueles que lutam pela transformação radical dessa sociedade decadente. As crises profundas trazem a ameaça da guerra, mas também abrem a possibilidade do NOVO, de processos revolucionários do movimento de massas. Não foi assim só em 29. Em crises de magnitude muito menor, como por exemplo a última de 2000-2003, teve lugar na América Latina processos de luta que derrubaram vários governos e teve lutas destacadas como foi a de Zanon, fábrica na Argentina que está ocupada há 7 anos produzindo sob controle operário. Além disso, houve também processos avançados como o levante no México que ficou conhecido como “Comuna de Oaxaca”.
Infelizmente, a perspectiva do marxismo e da revolução ainda não é adotada como saída devido ao resultado de 70 anos de stalinismo e 30 do chamado “neoliberalismo”, onde a revolução foi apagada da consciência das massas em patamares nunca antes conquistados pela burguesia, com um ataque em regra ao marxismo que encontrou pouca e débil resistência por parte do marxismo academicista e da esquerda sindicalista. Porém, o que também é verdade é que o marxismo, que era visto como uma coisa atrasada, em poucas semanas a realidade mostrou sua vigência.

A crise no Brasil e a crise da universidade

Só no Brasil, a “marolinha” já provocou mais de 2 milhões de demissões (cerca de 40% em SP) desde o agravamento da crise em setembro. Pesquisa Datafolha feita em 3 e 4 de fevereiro mostra que, em 31% dos domicílios paulistanos, pelo menos um trabalhador perdeu o emprego nos últimos seis meses. Enquanto isso, Lula destinou por distintas vias mais de 300 bilhões para salvar os capitalistas, enquanto para os desastres das enchentes destinou míseros 1,6 bilhões (cada vez fica mais claro como o capitalismo também arrasta a natureza em sua decadência) e 1, 1 bilhão para o combate à Dengue em 2009.
É inevitável que a profundidade da crise capitalista impacte nas universidades, principalmente em países onde houve um processo de privatizações estendido como no Brasil. O mais escandaloso é que mesmo com a expansão anárquica das faculdades privadas desde a Lei de Diretrizes e Bases de 1994 de FHC, o grau de elitização do ensino superior brasileiro continua sendo alarmante. Proporcionalmente, o número de universitários do Brasil é inferior ao da Bolívia e o vestibular não existe na maioria dos países da América Latina. Com o crescimento das privadas no país, a educação, longe de ser um direito de todos, torna-se cada vez mais uma mercadoria disponível apenas aos que podem pagar por ela. Para sermos mais concretos, o Censo de Ensino Superior de 2007 mostra que de cada 2 vagas disponíveis nas privadas, apenas 1 é ocupada. Desses, apenas 55% se formam. Sem falar da baixíssima qualidade de “ensino”. O processo de privatizações formou um verdadeiro nicho de valorização do capital, uma “bolha” alimentada pela disponibilidade do crédito necessário para a maioria dos alunos. Com a crise, essas faculdades mostram como funcionam como empresas e aprofundam a tendência anterior de demissões em massa, maximização dos contratos de trabalho, aumento exorbitante da mensalidade, corte de bolsas de estudo e expulsão dos alunos inadimplentes. E começou a resistência. A PUC-SP já é uma referência de lutas, mas desde o ano passado começaram a haver processos como a ocupação da Unisantos. E este ano começa com mobilização na Unisa, Unib e São Marcos.
O governo Lula conseguiu, pela via de medidas como o PROUNI e o REUNI, e mais recentemente com a aprovação de cotas nas universidades federais, aparecer para setores da população como se estivesse fazendo concessões históricas de “democratização das universidades”. Porém, a verdade é que houve mudanças apenas para um “neoliberalismo menos selvagem”, proporcionado pelo último ciclo de crescimento econômico. Podemos comprovar essa questão ao verificar que Lula destinou muita verba pública para os capitalistas das privadas, também continuou destinando verbas das pesquisas para a chamada “inovação tecnológica”, que vem se tornando a principal via de colocar a universidade a serviço dos capitalistas. E seu governo expandiu mais do que nunca o ensino à distância, que conta até com um ministério específico. Onde há uma diferença maior com relação à FHC é na ampliação de vagas nas federais (44 mil neste ano), que foi feita sem as verbas necessárias para evitar maior sucateamento e não reverte a tendência de uma expansão desenfreada das privadas, e na aprovação das cotas. É fato também que nas federais é onde a proporção de cursos diurnos é a maior, impedindo que os jovens trabalhadores possam estudar.
A crise também atingirá as universidades estaduais. A União divulgou na última semana de janeiro que a arrecadação do ICMS caiu 3,7% de outubro para novembro de 2008. São mais de 72 milhões de reais a menos nos cofres estaduais. O governo fluminense se prepara para corte de 500 mi em seu orçamento e o paulista congelou, por decreto (!!!!!), 1.56 bi de suas despesas. A principal fonte de financiamento das universidades estaduais paulistas é a arrecadação do ICMS, ou seja, certamente o repasse diminuirá. A verba destinada à permanência estudantil, ampliação de vagas com qualidade e contratação de técnicos e professores está ameaçada. Nem a jornada de ocupações de 2007 parou a ofensiva de Serra. Em junho de 2008, Serra sancionou a “lei de inovação tecnológica”, que avança na priorização da chamada pesquisa operacional e das fundações privadas. Em outubro a novidade do governo para a educação superior foi a criação da Univesp (Universidade Virtual do Estado de São Paulo), bastião do ensino à distância, vendido com a falsa idéia de “democratização” do ensino. E para passar esses ataques, é lançada uma ofensiva repressiva sobre os lutadores, como ocorre na USP, onde chegaram ao ponto de demitir em dezembro de 2008, Claudionor Brandão, diretor do Sintusp, o que configura claramente como uma perseguição àqueles que se colocam na linha de frente da batalha contra as medidas de Serra. A possibilidade concreta de contingenciamento de verbas, decorrente da crise, poderá aprofundar os golpes já deferidos pelo governo tucano assim como a repressão política aos lutadores.
A quantia exorbitante dos governos Lula e Serra destinada aos capitalistas mostra que a elitização do ensino não ocorre por falta de recursos, mas por estratégia política. Assim, entendemos que devemos partir das demandas mais urgentes e imediatas, como a luta por bolsas, pela redução da mensalidade, pela re-matrícula dos inadimplentes e pela contratação dos professores com a consciência de que estas lutas devem estar ligadas à busca por uma saída profunda para a universidade. Devemos, a partir da sala de aula, discutir sobre o papel da universidade, a quem ela serve, qual tipo de universidade queremos, como transformá-la, tomando o exemplo dos estudantes na Europa, lutar para que a universidade, a educação e a saúde do povo não paguem pela crise.
Para atender de forma plena essas reivindicações, devemos incorporar em nosso cotidiano a luta pela estatização das universidades privadas sob a base do não pagamento das dívidas externa e interna e por impostos progressivos às grandes fortunas; pela construção de uma universidade para todos, a serviço dos trabalhadores e do povo. Isso, decerto, é impossível se esperarmos pela boa vontade dos governantes, mas está muito longe de ser uma proposta irreal, ao contrário, está ligado ao impulso revolucionário potencialmente despertado em momentos de transformação social, como apontam os dias de hoje!
Mas somente a estatização de nada adiantaria se fossem conservados o vestibular e as arcaicas e burocráticas estruturas de poder vigentes nas universidades, pois seria mantida a mesma forma de ensino corporativa e elitizada. Por isso, a luta pela estatização deve estar ligada à luta pelo fim do vestibular. Dizemos: “ABRAM AS ESCOLAS E UNIVERSIDADES AOS FILHOS DOS TRABALHADORES E DO POVO”. Para isso, temos que lutar pela transformação da estrutura de poder universitária, arrancando o poder de decisão das mãos da burocracia acadêmica e transferindo-o àqueles que fazem a universidade funcionar: os estudantes, os funcionários e professores, para que juntos possamos construir uma universidade que coloque a estrutura e o conhecimento produzido a serviço dos trabalhadores, e não das empresas. Algumas pessoas dirão que esta é uma proposta “utópica”. A essas pessoas responderemos que utopia é acreditar que as universidades privadas poderão se sustentar, em meio à crise, sob seu modelo atual.

Organização dos estudantes pela base: auto organizado e aliado aos trabalhadores

É necessário abrir uma nova etapa no movimento estudantil brasileiro. Em 2007, o movimento estudantil ressurgiu, ainda carente de experiência, programa e estratégia capaz de levar às lutas a vitórias. Ao contrário, a burocracia estudantil, com sua política, isolou ainda mais o movimento estudantil da sociedade, deixando nas mãos do governo a bandeira da “democratização da universidade” ao não levantar nenhum programa capaz de desmascará-lo. Mas as derrotas podem ser transformadas em fortalezas se são um caldo de cultivo para tirarmos lições profundas que preparem embates superiores. Enterremos o movimento estudantil controlado pela burocracia que teme o novo! Por uma nova cultura na organização dos estudantes! Pela auto-organização e por entidades militantes que atropelem a burocracia estudantil! Assembléias preparadas com discussões em salas de aula! As entidades têm que abrir suas ferramentas, como boletins periódicos, para a discussão entre os estudantes e as correntes que compõem o movimento de forma democrática e política! Discussões em salas de aula e representantes por sala para permitir uma coordenação do movimento em cada curso sem o distanciamento da base! Temos que coordenar o movimento nacionalmente e não apenas nas universidades.
Fazemos um chamado aos estudantes que comecem a preparar reuniões e encontros estaduais que discutam como organizar a luta para que a juventude e os trabalhadores não paguem pela crise dos capitalistas. Organização de comitês de estudantes contra as demissões, que organize apoio ativo aos trabalhadores que percam o emprego e se incorporem à luta operária das fábricas que ameacem fechar frente à crise! Temos que deixar claro a polarização deste momento são eles ou nós! Encontros regionais com representantes de assembléias de base, de cursos ou faculdades que sirvam para preparar um encontro nacional de estudantes!

Os desafios do movimento estudantil e da juventude

Com a crise, o tão atacado marxismo revolucionário, agora parece ter dado um xeque em todas as teorias inimigas que tentaram enterrá-lo. Como agentes reprodutores da ideologia burguesa decadente, os intelectuais não poderiam estar mais perplexos ou chocados. Preferirão ruir junto com a ideologia burguesa ou traçar um caminho da auto-crítica e se ligarão aos trabalhadores e suas lutas? Será o ceticismo algo tão arraigado? Não sabemos. O que é certo é que sem uma nova geração de intelectuais marxistas revolucionários, essa ruptura será muito mais difícil e tortuosa. Assumimos o desafio de contribuir à recomposição do marxismo revolucionário e colocar de pé debates sobre marxismo nas universidades onde atuamos. A juventude não carrega nas suas costas o peso das derrotas do passado e dos rios de tinta dos livros, artigos e pesquisas que parecem ter sido escritos em vão. E não seremos nós que criaremos ou aceitaremos explicações burguesas para legitimar a bancarrota burguesa.
Quando a ideologia propagada nas recentes comemorações dos 40 anos do maio de 68 não era reacionária ou de uma mera “revolução cultural e sexual”, era, no melhor dos casos, envolta por um espírito saudosista no tom de “que bela a rebeldia daquela juventude”. Para nós, 68 não é uma lembrança do passado, mas um exemplo vivo cujas lições ganham maior energia frente ao capitalismo em crise e com a juventude nas ruas. Nada mais atual do que “do questionamento da universidade de classes ao questionamento da sociedade de classes”, do que a necessidade do movimento estudantil ser dentro da universidade a voz da maioria da sociedade, os trabalhadores e o povo pobre. A aliança estratégica entre estudantes e os trabalhadores (que na universidade tanto nos disseram que não existe), mostra sua necessidade. Unidade com os trabalhadores para que a crise seja paga pelos capitalistas! Viva 68 hoje!
Nos aliemos com a juventude trabalhadora, que são os que ocupam os trabalhos mais precários e são mais atacados pela crise, junto aos negros e as mulheres. Basta de um movimento estudantil que não ultrapassa os muros das universidades! Não haverá luta séria por uma transformação radical da universidade sem uma aliança com os que estão fora dela ou se matam para pagar mensalidades absurdas nas particulares. A aliança da juventude trabalhadora com o movimento estudantil pode ser um enorme potencializador das lutas na sociedade. Vamos às fábricas! Às escolas públicas secundaristas! Aos bairros da periferia! Chamamos especialmente os jovens trabalhadores que estão nas universidades para nos organizarmos conjuntamente.
Mais do que nunca é urgente a necessidade de organizar-se para responder aos ataques e passar à ofensiva! Transformar radicalmente as universidades e abrir caminho para uma nova sociedade. Participe das nossas atividades e conheça o Movimento A Plenos Pulmões! Leia, difunda e construa esse boletim! Desatai o futuro!



[1] Usou números para justificar a comparação: o crédito, como porcentagem do PIB (Produto Interno Bruto), subiu de 160% em 1929 para 260% em 1932, como conseqüência da deflação e da queda da atividade econômica. ,Já nesta crise, o crédito, que era 360% do PIB em 2008, aumentará até 500% nos próximos anos.

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