Publicado no Jornal PUCViva nº728 de 22/02/2010
Felipe Campos
Na primeira quinta-feira do ano letivo (11/02), o reitor Dirceu de Mello promoveu no Tucarena uma aula inaugural no período matutino e noturno para falar de "Juventude e Política". Bom, eles puderam falar... A juventude não!
Uma 1ª semana diferente para uma universidade que está diferente. Talvez por ter início uma semana antes do Carnaval, a PUC-SP estava ainda em um clima de férias e festa. Claro, com exceção dos trabalhadores terceirizados, que não sentiam esse clima, pelo contrário, muitos deles trabalharam também nesse feriado popular em jornadas extenuantes para ganhar a miséria de sempre, sendo que seus filhos e filhas poucas condições têm em estudar na universidade em que os pais trabalham.
Mas, voltando ao "clima" da PUC-SP, nos corredores do Prédio Velho entre alguns estudantes veteranos e professores, independente da posição política, o que se ouvia quase como consenso é que "a PUC-SP não é mais a mesma!". Todos se perguntavam: onde está aquela efervescência intelectual e política que sempre foi característica da universidade? Será que nós mesmos somos culpados disso? Se formos responder essas questões com o mínimo de reflexão iremos perceber que o problema está "mais em cima". Mais exatamente entre o "céu" clerical da Fundasp e a Reitoria!
Em sua aula inaugural para os calouros, o reitor Dirceu de Mello convidou dois políticos da ordem, que segundo as palavras do pró-reitor Hélio Deliberador, representavam todos os professores da casa. Então, os professores andam muito mal representados. Gabriel Chalita (PSB) e José E. Cardozo (PT), políticos da base governista, cujos partidos ano passado defenderam Sarney e todos os senadores corruptos do Congresso, legitimando e tentando salvar uma instituição de caráter antipopular onde se concentram oligarquias que detém o poder político do país a séculos desferindo ataques a toda a população, foram discursar sobre "Juventude e Política" para os novos estudantes (imagine o quanto eles têm a ensinar). Entretanto, o pior ainda estava por vir com direito a cair de vez a máscara da demagogia do atual reitor da Pontifícia.
Nessa mesma noite, dezenas de estudantes foram até a palestra, também para questionar Cardoso sobre a sua defesa, junto a Lula e seu partido, pela manutenção das Tropas Brasileiras no Haiti (sendo que até mesmo o mentor da pedagogia "Paz e Amor", Chalita, palestrante do período matutino, está em um partido que também defende as tropas militares que atuam sem paz e sem amor contra a população haitiana). Os estudantes levaram cartazes, faixas dentro de uma manifestação pacífica num ambiente de tradição democrática e de diálogo, em que sua própria arquitetura remete a isso. Porém, quando reivindicaram depois da apresentação dos convidados, uma fala em solidariedade ao povo haitiano, o reitor Dirceu de Mello ferozmente levantou, dirigiu-se aos estudantes e começou a tentar uma intimidação perguntando e gritando: "Quem está falando? Quem está falando? Identifique-se!"
Os estudantes levantaram, pediram novamente o direito a uma fala, mais do que justo numa palestra onde se discute "Juventude e Política". Mas a resposta de Dirceu foi firme e objetiva, relembrando o verdadeiro Dirceu das câmeras e catracas de 2004 e não o falso Dirceu do diálogo e da democracia de 2009: "Isso aqui não é debate é uma aula!". Ou seja, não existe diálogo, aluno não pode refletir, divergir, fazer política, apenas respeitar sua condição de aluno. Não à toa Deliberador citou Hannah Arendt no início da apresentação, teórica que defendia que o movimento estudantil norte-americano não poderia apoiar os negros que sofriam racismo nos EUA, pois estariam saindo da sua esfera de atuação na sociedade.
Talvez esse fato mostre alguns elementos para podermos pensar sobre aquelas perguntas do início do artigo. E reforce que nós, estudantes, professores e funcionários, que não nos sentimos representados por esses que dizem que nos representam, que dizem ser eleitos pelo nosso voto, comecemos a contestar permanentemente e recriar a vida política, cultural e artística dessa universidade. Os estudantes que lá foram protestar queriam dizer que o povo haitiano não precisa de tropas imperialistas e brasileiras armadas até os dentes que servem para a repressão política e social. Eles precisam de médicos, enfermeiros, alimentos e remédios nas mãos deles, não de soldados. Porém, a Reitoria da universidade prefere dar voz aos que querem a militarização do Haiti, os que fecham o aeroporto e impedem a chegada de alimentos para a população, e não aos estudantes da casa que questionam esse tipo de ideologia.
Felipe Campos é estudante de Ciências Sociais e militante do Movimento a Plenos Pulmões (LER-QI e independentes)
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